Insanidades
Acordo estremunhado ao som da chuva que cai copiosamente. Forço novamente o sono mas a espertina já se tinha instalado. No meu pensamento apenas surge a tua imagem e o meu desejo de te ter aqui. Dou voltas na cama como se procurasse o calor do teu corpo, como quem procura a serenidade de um abraço aconchegante, daquele beijo carinhoso. O barulho de um carro a trabalhar na rua interrompe os meus pensamentos e questiono-me que horas serão. Seis da manhã e já há quase uma hora que me embrulho contigo nos meus pensamentos. O trabalhar barulhento e constante daquele carro, faz-me viajar pelos momentos que estivemos juntos, dos sorrisos que te provoquei com a minha falta de jeito para seduzir, dos momentos em que nos abraçámos, mas principalmente, das vezes que te devia ter beijado, e que por falta de coragem, não te beijei.
O carro arrancou, a chuva já não cai, o silêncio imperou. Regresso novamente à minha realidade solitária, um corpo moribundo numa alma à espera de ser conectada, a ti, ao teu ser, à tua essência. A chuva regressa espaçadamente ao compasso de um relógio louco. Tento escrever algo para ti, mas as palavras não fluem, não saem, parecem aprisionadas à espera do momento certo para serem espressadas. Apenas os pensamentos libidinosos da tua presença permanecem intactos, adensando cada vez mais o meu desejo de te tocar, de percorrer como os meus lábios cada centímetro do teu corpo, de descobrir os gatilhos que fazem a tua pele arrepiar, de penetrar nos teus recônditos mistérios, de tornar a tua respiração ofegante, de te fazer sentir amada, desejada, extasiada.
Pudesse eu materializar os pensamentos e estarias aqui, agora, neste momento, nós dois numa dança corporal intensa, em desejos quase insanos de nos possuirmos, de nos fundirmos num único corpo, numa única alma, fazendo parar o tempo e por momentos, todo o universo conspirava, a lua corava, o coração disparava, o êxtase final acontecia numa cama molhada, em corpos suados, saciados por fluidos trocados.
A chuva parou, o despertador tocou, o sonho acabou… talvez seja apenas um sonho meu, talvez seja um desejo que para ti nunca aconteceu…
Escrevo-te mais uma mensagem, mais uma declaração de amor, mas como aconteceu em todas as outras vezes, não tenho coragem de te as enviar…
Levanto-me, tomo um banho rápido como que sacode a poeira da insanidade. Tomo o meu chá de ervas misteriosas que me fazem despertar enquanto observo a alvorada que nunca mais chega. Inspiro, respiro e saio para mais uma manhã de trabalho. O meu fim de semana aproxima-se, mas no horizonte apenas vejo as nuvens da saudade, de não te ter aqui, ao pé de mim. E enquanto conduzo até ao meu destino, penso no paradoxo desta minha vida insana, em tu és das coisas mais reais que tenho, e no entanto, és apenas uma utopia…