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Fragmentos de Miguel Moreno

recordações, paixões, aventuras de quem já viajou por todo o país... a vida é bela

Conto de Natal

22.12.21, MM
 
 
 
 
Por vezes, ao longo dos anos, passamos ou presenciamos acontecimentos, que de uma forma ou de outra nos marcam para a vida. Este conto escrevi-o à exatamente quatro anos. É uma história fictícia com personagens inventadas. Hoje fez-me sentido e resolvi partilha-la tal como a escrevi.  Que nunca se perca a magia e a genuinidade do Natal. Desenhos da minha filha! Espero que gostem!
 
 
 
 
 
Podia ter sido um Natal como outro qualquer... mas este foi especial...
 
Mariana era uma menina de 6 anos que tinha ido pela primeira vez para a escola e como era muito tímida não tinha feito grandes amigos. Vivia com João, o seu irmão mais velho e seus pais, André e Sónia. Mas este tinham empregos muito importantes e pouco brincavam com os filhos. João não se importava, já que passava muito tempo a jogar consola.
 
Os natais costumavam ser passados na sua casa ou em casa da família de Mãe, já que eram de famílias ricas. Mas este ano e pela primeira vez desde que Mariana nasceu, iam passar em casa dos avós paternos, que viviam numa aldeia bem no interior e longe da grande cidade. Estavam um pouco doentes...
 
A viagem foi longa e já era noite quando chegaram à aldeia. A casa era ainda de pedra. Lá dentro estavam os avós à lareira que se levantaram com algum custo para os receberem de braços abertos. O jantar já estava pronto e começaram logo a comer. A seguir ao jantar, Mariana estava tão cansada que adormeceu logo, bem enrolada nos cobertores.
 
Na manha seguinte Mariana acordou cedo, desceu as escadas e viu o avô à lareira, que tomava o pequeno almoço. Juntou-se a ele e enquanto comia, o avô contava-lhe histórias do pai quando era mais novo "André era um bom menino mas muito traquina!" Depois de já todos terem tomado o pequeno almoço os pais decidiram ir à vila fazer as ultimas compras, mas Mariana preferiu ficar com o avós que lhe tinham prometido dar uma volta pela aldeia. Assim que saíram cruzam-se com Leandro, um rapaz da mesma idade que se ofereceu para mostrar a aldeia. Após consentimento dos avós os dois seguem pelas ruas da aldeia, primeiro timidamente mas depois começam a correr e a brincar. De repente começou a nevar. Mariana nunca tinha visto neve e ficou um pouco assustada, mas rapidamente ficou tão feliz e maravilhada que se abraçou a Leandro e começaram a andar à roda. Fizeram pequenas bolas de neve e começaram a atirar um ao outro. Estavam tão distraídos que nem reparam na presença do avô, que se desatou a rir ao ver que eles se tinham assustado.
 
Foram para casa e nessa altura chegaram os tios e os primos para o almoço. A azafama era grande e quando acabaram de almoçar, o irmão e os primos entretiveram-se a jogar nos tablets. Mariana não parava de olhar pela janela até que viu Leandro e foi pedir para ir lá para fora. A mãe  disse que não, mesmo perante a insistência dos avós. Mariana já muito triste virou-se para o pai e disse lhe " pensei que tinhas sido feliz aqui" aos que os avós lhe responderam " e foi muito feliz, mas pelos vistos já se esqueceu disso". André levantou-se e mesmo contrariando Sónia, agasalhou a pequena Mariana e disse-lhe para se ir divertir.
 
 
Saiu a correr e foi ter com Leandro dando um grande abraço e seguiram para onde havia mais neve. Fizeram muitos bonecos com a neve, tiraram fotografias com o telemóvel de Mariana, rebolavam e corriam até já não aguentarem mais. Quando começou a escurecer, foram para suas casas, mas antes de se separarem, Leandro tirou de dentro do casaco uma boneca de trapos e ofereceu a Mariana, dizendo-lhe que era a sua mãe que as fazia e que tinha achado aquela a mais bonita. Os olhos dela brilharam ainda mais, deu-lhe um beijo na face e disse-lhe que a boneca era lindíssima. Algum tempo depois de jantar, chegou finalmente o pai natal. Havia montes de prendas e muitas para Mariana, desde casa de bonecas, roupa, livros, bolsas e até um novo telemóvel. Mas enquanto todos experimentavam as novas prendas, Mariana passeava e imaginava novas histórias com a sua nova boneca de trapos. E na hora de dormir, adormeceu agarrada a ela.
 
Amanheceu com um grande nevão. Mesmo assim Mariana queria ir visitar o seu amigo. O avô pediu-lhe para levar um bolo rei e alguns doces que tinham muita comida. O pai ofereceu-se para acompanhar Mariana e chegando lá acabaram por entrar. Mariana foi brincar com Leandro para o quarto e contou-lhe radiante como tinha sido a sua noite de natal. Leandro disse-lhe que só tinha recebido uma camisola e um carrinho, porque o pai natal estava muito pobrezinho. Contou depois que o seu pai estava desempregado e mãe fazia algumas bonecas para vender e as vezes os dois faziam algumas limpezas na vila. Mariana ficou ainda mais triste ao saber que nem sequer tinham tido um bolo rei.
Quando o pai a chamou, Mariana desceu triste e foi o caminho todo calada. No hora de almoço não conseguia comer e quando perguntaram porque não comia começou a chorar. " sabiam que os pais do Leandro não têm nada para comer? Sabiam que o pai está desempregado?". O avô acabou por contar que eles tiveram azar porque a fabrica onde trabalham fechou e que não tiveram direito a nada. Mas que também não sabia que a situação era tão grave. Mariana não parava de chorar e acabou por sair da mesa. O pai seguiu-a  e foi falar com ela. " Se pudesses voltar a pedir alguma coisa ao pai natal o que pedias? Mariana olhou nos olhos do pai e disse-lhe "trocava todas as minhas prendas só para que o Leandro pudesse ter um natal feliz". O pai pensou um pouco e disse-lhe firmemente que desejasse muito para que o seu pedido se realizasse e que o natal ainda não tinha acabado. Pediu a Mariana para ir para a mesa e dizer que também já iria.
 
Na manha seguinte era o dia de regressarem. Mariana não queria voltar. Tinha feito o seu primeiro amigo de verdade. Queria dar-lhe alguma coisas. O pai sugeriu que lhe oferecesse o seu telemóvel antigo que ainda estava em bom estado. Assim podiam falar mais vezes. Mariana abraçou forte o pai.
 
 
Estavam quase a ir embora quando finalmente apareceu Leandro eufórico. "o meu pai arranjou trabalho! o meu pai arranjou trabalho!" Naquele momento Mariana acreditou na magia do natal. Ofereceu-lhe o telemóvel e depois disso, olharam-se nos olhos e abraçaram-se e com os olhos a chorar se despediram sem dizer uma única palavra. Leandro correu atrás do carro até não ter mais forças enquanto Mariana encostava a mão no vidro de trás desistindo apenas muito depois de o deixar de ver.
 
Mariana saiu da aldeia de coração cheio e embora se sentisse triste por se ter separado de Leandro, tinha a certeza que tinha recebido a melhor prenda de todas: um amigo para toda a vida e aquela boneca de trapos iria ser para sempre a sua melhor recordação!
 
Vitoria, vitória, acabou-se a historia!
 
 
 
 
 


Que o espírito do Natal ilumine todos os corações. Boas Festas!

Melancolias

19.12.21, MM

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Aguardo apático a chegada dos primeiros raios de sol. Sei que romperão por entre as estreitas fissuras dos estores que mantêm o meu quarto escuro, frio, na melancolia das noites vazias de essência, de vida, do amor. Tudo me parece tão previsível, tal qual um qualquer guião escrito a conta-gotas, pausado, reflexo dos eternos dias passados em tons cinzentos. Aconchego-me a um canto da minha imensa cama. “para que tanto espaço?” questiono-me impacientemente enquanto volto a olhar para as estreitas fissuras. Ouso palmear os finos lençóis de flanela para além do calor do meu corpo, mas não existe mais nada para além de um tecido frio, imaculado, sem histórias de corpos que nunca ousaram os meandros do prazer, que nunca ficaram amarrotados nem tão pouco molhados por corpos que nunca se deleitaram em ofegantes suores e gemidos.

Não sei quanto tempo já passou nesta melancólica manhã, nem tão pouco sei dizer se está frio ou calor, se há pessoas na rua a caminhar despreocupadas em mais um fim-de-semana repetido. Observo a claridade a invadir lentamente o quarto, mas o sol, esse, ainda deve continuar escondido para além do monte. Talvez, se eu vivesse do outro lado do monte, poderia usufruir dos primeiros raios de sol! Mas o que importa… a melancolia dos dias que passam repetidamente seriam iguais.

Por fim levanto-me, apressado, sem me despedir da cama quente que me deu abrigo na fria noite, que foi confidente dos meus desabafos. Talvez seja melhor assim, talvez esteja melhor sem mim. Dispo a roupa que conheceu todos os segredos do meu corpo e atiro-a aleatoriamente para cima da cama. Talvez estejam bem uma para a outra. Dirijo-me aborrecido para a janela do quarto tentando perceber a ausência dos raios do sol. Ainda meio atormentado, lembro-me que o sol nasce na outra ponta da casa. Abro apressado a porta do quarto que me levará por entre o corredor até à sala. No chão e nas paredes, já estão tatuados os raios de sol, que rompem freneticamente por entre as friestas dos estores ainda meio fechados. Deambulo o meu corpo desnudado  por entre o corredor, passada lenta, observando encantado os pingos de luz trepando o meu corpo com o aproximar da janela. Sinto a luz a trepar no intimo do no meu corpo, trespassando-o, libertando a minha alma para lugares paradisíacos. Encerro os olhos e deixo que os mais secretos desejos tomem conta de mim, do meu corpo nu, embebido em pensamentos pecaminosos, devaneios promíscuos, sensações de um prazer urgente, emergente. Puxo a compasso os estores da porta vidrada que dá para a varanda. Deixo o calor trespassado pelo vidro, apodera-se do meu corpo que lentamente elimina as pequenas sombras, outrora preenchidas pelas estreitas friestas que não deixavam passar o sol. 

E ali estou, à janela, observando a minha floresta encantada, mágica, cheia de vida, de seres enigmáticos, dos pássaros falantes, das árvores que guardam os segredos dos amantes que por ali ousam entrar e praticar a arte do amor. Em tempos, traziam-me notícias de todos os lados, novidades frescas trazidas pelo vento. Agora já não, talvez eu tenha perdido o encanto ou a sensibilidade de as compreender, talvez seja reflexo da melancolia dos meus dias pintados em tons cinzentos,  de quem já não anseia por um amanhecer diferente. 

Permaneço mais um pouco encostado ao pilar da porta, desnudado, provocador, deleitando-me em pensamentos eróticos. Talvez até possa estar a ser observado de uma janela distante, ou talvez os pássaros gravem a minha imagem escandalizados, transportando-a até à beatas fervorosas de poder observar  e depois com ar de desdém, criticarem. Ou, quem sabe, talvez por alguém que me observe através de uma bola de cristal, e nesse universo alternativo, percorramos os mesmos caminhos corporais em busca dos mais secretos desejos, de explorar a sensibilidade dos pontos que provocam a respiração ofegante, os gemidos que não pedem ser contidos e muito menos silenciados, na urgência de sentir os lábios molhados num beijo ardente, eloquente, apaixonante, descendo, subindo, entrando, saindo, possuindo avidamente numa dança corporal, animal, rumo ao êxtase final.

Hoje quebrei a melancolia dos dias pintados em tons de cinzento. Talvez hoje escreva um poema cheio de cor, talvez fale do erotismo que me corre nas veias ou do amor emaranhado nas suas teias. Talvez hoje fale de ti…

Oh lua, oh luar,

10.12.21, MM

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Sigo os caminhos da noite escura que me invade a alma

Soltam-se em mim os desejos carnais que ouso desfrutar com calma

Becos, dunas, mansões ou meras casas abandonadas

Antros de prazer amordaçados por saias amarrotadas, molhadas

Feitiços hipnóticos protagonizados pela cheia lua

Eu aqui, desejo ardente, eloquente, de nos meus braços ter-te nua

Desnudada, enfeitiçada, atiçada, mordendo o isco, arrebitada

Corpos exaltados, excitados, roçando o clímax da tesão

Fogo ardente percorrendo as entranhas da paixão

 

Oh lua, oh luar, 

Encantamento da fera que ousa se libertar

Loba com o cio na emergência do prazer, de acasalar

Toque ardente, emergente, fantasia latente

Oh lua, oh luar

Toca no meu íntimo e vem-me… amar?

Amor provocador emergido no teu calor

Quero-te em mim e eu quero-te em ti

Agora, já, sem mas nem porquês, neste momento

Desfrutar no teu corpo todo o meu arrebatamento

E no êxtase final abraça-te com todo o sentimento

Caídos, exaustos, embebidos no deleite prazeroso

Entrelaçados num abraços sentido e gostoso

Abençoados pela lua, e eu contemplando-te nua

Beleza ímpar que faz o meu coração disparar

Perdido do teu sorriso, e eu sem juízo, roubo-te mais um beijo

Fruto do meu desejo, do meu ensejo

De nos teus braços pernoitar

Oh lua, oh luar…

Pertencer

05.12.21, MM

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Pertenço ao mundo, à terra, à natureza

Liberdade sonhada que defendo com firmeza

Estradas imaginadas na sua infinita beleza

Mapa de estrelas desenhadas com destreza

 

Pertenço às pessoas que me rodeiam

Mulheres que por mim um dia se apaixonaram

Corpos exaltados que na chama incendeiam

Secretos desejos que no fogo se propagaram

 

Pertenço a quem ousa a minha alma tocar

Amizade, amor, paixão, tudo vivido em liberdade

Aldeias, vilas, cidades ou qualquer outro lugar

E por onde passar, levarei comigo a saudade

Serei de todos e de todos serei alguém

Vagabundo à conquista do mundo

Anestesiado num sonho profundo

Mas o meu coração

Esse,

Será sempre teu

Teu, e de mais ninguém…